segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Santo Hilário de Poitiers, Doutor da Igreja, 13 de Janeiro


Audiência geral: 
Santo Hilário de Poitiers
Texto integral
 ROMA, Quarta-feira, 10 de Outubro de 2007 (ZENIT.org) – Publicamos abaixo o texto integral da catequese dada pelo Papa Bento XVI durante a audiência geral, nesta quarta-feira, na Praça de São Pedro.

Caros irmãos e irmãs,

Hoje, quero falar de um grande Pai da Igreja do Ocidente, Santo Hilário de Poitiers, uma das grandes figuras episcopais que marcaram o Século IV. Ao longo do confronto com os arianos, que consideravam o Filho de Deus, Jesus, como uma criatura, sem dúvida eminente, porém unicamente como uma criatura, Hilário consagrou toda a sua vida à defesa da fé na divindade de Jesus Cristo, Filho de Deus e Deus, como o Pai, que O gerou na eternidade.

Não dispomos de informações precisas sobre a maior parte da vida de Hilário. As fontes, muito antigas, dizem que ele nasceu em Poitiers, provavelmente em torno do ano 310. Oriundo de uma família abastada, ele recebeu uma sólida formação literária, bastante evidenciada em seus escritos. Não é provável que ele tenha crescido num meio cristão. Ele mesmo nos fala de um caminho de busca pela verdade que, pouco a pouco, o conduziu ao reconhecimento do Deus Criador e do Deus Encarnado, morto para nos dar a Vida Eterna. Batizado por volta do ano 345, ele foi eleito bispo de sua cidade natal em meados de 353-354. Nos anos seguintes, Hilário escreveu sua primeira obra, o Comentário ao Evangelho de Mateus. Trata-se do mais antigo comentário em língua latina que temos sobre este Evangelho. Em 356, Hilário assiste como bispo ao Sínodo de Béziers, no Sul da França, segundo suas próprias palavras, o "Sínodo dos Falsos Apóstolos", pois a reunião foi dominada por bispos filo-arianos, que negavam a divindade de Jesus Cristo. Esses "falsos apóstolos" pediram ao Imperador Constantino a condenação ao exílio do bispo de Poitiers. Hilário foi, assim, obrigado a deixar a Gália durante o verão de 356.

Exilado na Frigia, atual Turquia, Hilário encontrou-se em contato com um meio religioso totalmente dominado pelo arianismo. Lá também, sua solicitude de pastor moveu-o a trabalhar incansavelmente pelo restabelecimento da unidade da Igreja, calcada sobre a fé justa formulada pelo Concílio de Nicéa. Foi com este objetivo que ele começou a redação da sua obra dogmática mais importante e conhecida: De Trinitate (Sobre a Trindade). Nela, Hilário expõe seu caminho pessoal rumo ao conhecimento de Deus, e se preocupa em mostrar que as Sagradas Escrituras atestam claramente a divindade do Filho e sua igualdade com o Pai, não somente no Novo Testamento, mas também num grande número de páginas do Antigo Testamento, no qual já aparece o mistério do Cristo. Face aos arianos, ele insiste sobre a verdade dos Nomes do Pai e do Filho, e desenvolve toda a sua teologia trinitária a partir da fórmula do Batismo que nos foi dada pelo Senhor mesmo: "Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo".

O Pai e o Filho são da mesma natureza. E se certas passagens do Novo Testamento podem fazer supor que o Filho é inferior ao Pai, Hilário oferece regras precisas para evitar interpretações errôneas: certos textos das Escrituras falam de Jesus como (falam) de Deus; outros evidenciam sua humanidade. Certos textos se referem a Ele na sua pré-existência junto ao Pai; outros levam em consideração o estado de "abaixamento" (kenosi), ou seja, sua descida até a morte. Outros textos, enfim, O contemplam na glória da Ressurreição. Durante os anos de seu exílio, Hilário escreveu igualmente o Livro dos Sínodos, no qual ele reproduz e comenta, para seus confrades bispos da Gália, as confissões de fé e outros documentos de sínodos ocorridos no Oriente por volta da metade do Século IV. Sempre firme na sua oposição aos arianos radicais, Santo Hilário mostra um espírito conciliador perante os que aceitavam professar que o Filho era semelhante ao Pai na Sua essência, naturalmente procurando conduzi-los à plenitude da fé de Nicéa, segundo a qual não há somente uma semelhança, mas uma verdadeira igualdade do Pai e do Filho na divindade. Isso também me parece característico: o espírito de conciliação que busca compreender aqueles que ainda não chegaram à fé, e que os ajuda, com uma grande inteligência teológica, a alcançar a plenitude da fé na verdadeira divindade do Senhor Jesus Cristo.

Em 360 ou 361, Hilário pôde finalmente retornar à sua pátria, após o exílio, e retomou imediatamente a atividade pastoral na Igreja, mas a influência do seu magistério estendeu-se, na verdade, para muito além das fronteiras do seu país. Um sínodo ocorrido em Paris, em 360 ou 361, retoma a linguagem do Concílio de Nicéa. Alguns autores antigos pensam que esta mudança anti-ariana do episcopado da Gália deveu-se, em grande parte, à firmeza e à mansidão do bispo de Poitiers. Este era precisamente o seu dom: conjugar a firmeza na fé e a doçura nas relações interpessoais. Durante os últimos anos de sua vida, ele redigiu ainda os Tratados sobre os Salmos, um comentário sobre cinqüenta e oito Salmos, interpretados segundo o princípio sublinhado na introdução da obra: "Não há dúvida alguma de que todas as coisas que são ditas nos Salmos devem ser entendidas segundo o anúncio evangélico, de modo a que, qualquer que seja o tom com que o Espírito profético fale, tudo esteja ligado ao conhecimento da vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, encarnação, paixão e reino, e à glória e poder da nossa ressurreição" (Instructio Psalmorum 5). Ele vê em todos os Salmos esta compreensão do mistério do Cristo e de Seu Corpo, que é a Igreja. Em diversas ocasiões, Hilário encontrou São Martinho: precisamente perto de Poitierso futuro bispo de Tours fundou um monastério, que existe ainda hoje. Hilário morreu em 367. Sua memória litúrgica é celebrada em 13 de janeiro. Em 1851, o Bem-Aventurado Pio IX o proclamou Doutor da Igreja.


Para resumir o essencial da sua doutrina, eu quero dizer que Hilário encontra o ponto de partida de sua reflexão teológica na fé batismal. No De Trinitate, Hilário escreve: Jesus "pediu para que se batize em Nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo (cf. Mt 28, 19), quer dizer, na profissão de fé no Autor, no Filho Único e no Dom. Há somente um Autor de todas as coisas, pois Deus Pai é um só, do qual tudo procede. E Nosso Senhor Jesus Cristo é um só, através do qual tudo foi feito (1 Co 8, 6), e o Espírito é um só (Ef 4, 4), Dom em todos... Nada pode ser encontrado que falte a uma plenitude tão grande, em que a imensidão do Eterno, a revelação na Imagem, a alegria do Dom convergem para o Pai, o Filho e o Espírito Santo" (De Trinitate 2, 1). Deus Pai, sendo inteiramente Amor, é capaz de comunicar em plenitude Sua divindade ao Filho. Acho particularmente bela a seguinte fórmula de Santo Hilário: "Deus conhece apenas o Amor, Ele não sabe ser mais nada além de Pai. E Aquele que O ama não é invejoso, e Aquele que é o Pai, o É na Sua totalidade. Este Nome não admite ficar comprometido como se Deus pudesse ser o Pai sob certos aspectos, mas não o fosse sob outros" (ibid. 9, 61).

Eis por que o Filho é plenamente Deus sem falta alguma nem diminuição: "Aquele que vem da Prfeição é Perfeito, pois Aquele que tudo tem, tudo Lhe deu" (ibid. 2, 8). É apenas no Cristo, Filho de Deus e Filho do homem, que a humanidade encontra sua salvação. Assumindo a natureza humana, Ele uniu cada Homem a Ele, "Ele se fez nossa carne para todos" (Tractatus in Psalmos 54, 9) ; "Ele assumiu em Si a natureza de toda carne, e por meio desta Ele se tornou a Verdadeira Vida, Ele possui em Si as raízes de cada galho" (ibid. 51, 16). É precisamente por esta razão que o caminho para o Cristo é aberto a todos – pois Ele atraiu cada um na sua natureza de homem – mesmo se a conversão pessoal se faz sempre necessária: "Através da relação com Sua carne, o acesso ao Cristo é aberta a todos, contanto que eles se despojem do homem velho (cf. Ep 4, 22) e que eles o preguem sobre sua cruz (cf. Col 2, 14); contanto que eles abandonem as obras de outrora e que eles se convertam, para serem enterrados com Ele no Seu batismo, visando a Vida (cf. Col 1, 12; Rm 6, 4)" (ibid. 91, 9).

A fidelidade a Deus é um Dom da Sua graça. Eis por que Santo Hilário pede, ao final de seu Tratado sobre a Trindade, para conseguir permanecer sempre fiel à fé do Batismo. É uma característica deste livro: a reflexão se transforma em oração, e a oração volta a ser reflexão. Todo o livro é um diálogo com Deus. Eu quero concluir a catequese de hoje com uma destas orações, que se torna, assim, a nossa oração: "Faça, ó Senhor - recita Santo Hilário de maneira inspirada - que eu permaneça sempre fiel ao que eu professei no Símbolo da minha regeneração, quando fui batizado no Pai, no Filho e no Espírito Santo. Faça com que eu Te adore, nosso Pai, e ao mesmo tempo que eu adore Teu Filho; faça com que eu mereça Teu Espírito santo, que procede de Ti através do teu Filho único... Amém"  (De Trinitate 12, 57).

Tradução:
Gisele Pimentel
gisele.pimentel@gmail.com

Fontes:
http://www.zenit.org/article-16375?l=french

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